quarta-feira, 23 de março de 2011

Chapada dos Veadeiros faz trilha para cego.

Chapada dos Veadeiros faz trilha para cego.

Com 880 metros, área para deficientes visuais permite que eles conheçam a diversidade do Cerrado e tomem banho de cachoeira
 
 
Crédito: Funatura/Divulgação
As belezas naturais do Cerrado também podem ser apreciadas, pelo menos em parte, não apenas com os olhos, mas com outros sentidos, como o olfato, o tato e a audição. É o que mostra um projeto na Chapada dos Veadeiros, que construiu pela primeira vez no Brasil uma trilha especialmente para deficientes visuais. Sem enxergar, eles conseguem apreciar aspectos do meio ambiente que passam despercebidos pela maioria das pessoas.

A trilha foi inaugurada em 3 de setembro, na Reserva Particular do Patrimônio Natural Cachoeira Bonita, no município goiano de Colinas do Sul, na Chapada dos Veadeiros. A cerca de 280 quilômetros de Brasília, a reserva é uma das que foram criadas no Cerrado como parte do PNUD, que conta com o apoio do GEF (Fundo para o Meio Ambiente Mundial).

São 880 metros de trilha, com corrimãos e cabos-guia para orientar os visitantes, que vão até a Cachoeira do rio Tocantinzinho e conhecem mais de 120 espécies de árvores, como ipês, indaiás e jatobás — todas com aromas distintos para serem apreciados. Placas de identificação feitas com chapas de radiografia reutilizadas trazem informações em braile sobre as plantas e os cuidados que devem ser tomados.

Ao longo do percurso, os deficientes visuais podem ter contato com diversas formações do Cerrado, como mangue, cerrado rupestre, área alagada, mata seca e áreas abertas, afirma o coordenador da implantação da área, o geógrafo Adolpho Kesselring, da organização não-governamental Funatura (Fundação Pró-Natureza, que atua no Cerrado há 20 anos).

O que mais se destaca no projeto, no entanto, é que ele é o primeiro em que os cegos poderão ter contato mais direto com a natureza. “Há outros espaços reservados para quem tem deficiência visual, mas eles geralmente são concretados, ou em gramados, cercados de pinheiros”, explica Kesselring. “Os deficientes visuais também querem andar na terra, na areia, no cascalho, nas rochas”, conta ele. “É preciso desmistificar essa coisa de que só porque a pessoa não enxerga ela precisa ser superprotegida”, afirma.

Na trilha, os deficientes visuais podem subir nas rochas e até tomar banho de cachoeira, em uma área de águas rasas e com pouca correnteza que lhes foi reservada. “É surpreendente vê-los fazendo o passeio. Muitas pessoas que enxergam às vezes ficam com medo de subir nas rochas, mas eles vão lá, sobem, enfrentam, querem experimentar tudo”, conta Kesselring.

“Eles não enxergam, mas vêem a natureza de um modo que as pessoas que enxergam não conseguem. Há estímulos naturais que vão muito além dos visuais, mas que nos passam despercebidos”, explica, citando o cheiro das árvores, as texturas, o barulho da cachoeira. Na abertura da trilha, para tentar mostrar que os outros sentidos podem ser melhores explorados numa caminhada pela mata, os próprios cegos serviram de guia de pessoas que enxergam, mas que estavam de olhos vendados.

Para ir até a reserva é preciso pegar a rodovia GO-118, em direção a Alto Paraíso; 35 quilômetros depois do povoado de São Jorge, segue-se em direção a Niquelândia. A partir daí, há placas indicando o caminho até a Cachoeira Bonita.

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